terça-feira, 25 de setembro de 2007

Eucalipto


Sento hoje para escrever com três materiais mui diversos em mãos: um caderno especial de A Gazeta, um panfleto da Brigada Indígena e a lembrança de tudo o que vi na semana louca de Feira do Verde e coisas mais. Começando pelo relato pessoal, domingo retrasado eu voltava de mais uma viagem a Bom Jesus do Itabapoana, que fica na divisa do Espírito Santo com o Rio de Janeiro. Na estrada só seca, seca, queimada. Espero que no verão chova direito, se não nem quero imaginar o que vai ser daquelas bandas. Em meio ao deserto de repente surgiu uma plantação verdinha de saltar aos olhos. Enquanto comentava “que maravilha, vida!” meu pai me deu a notícia: “isso aí é eucalipto”. Eucalipto. E lá se foi o meu encanto.

Nem todo mundo sabe o que o eucalipto faz na natureza. Na verdade muita gente mesmo não sabe. Indo para o caderno especial d’A Gazeta, uma pérola intitulada “Indústria Madeireira e Moveleira do Norte do Espírito Santo” que guardo desde 25 de novembro do ano passado, dou de cara na capa com as chamadas: “Saiba mais sobre as vantagens do eucalipto” e “Distribuição de mudas de eucalipto chega a 5 milhões em janeiro”. Meu Deus. E não pára por aí. É uma pontada no peito atrás da outra. “O eucalipto é uma das plantas mais úteis que já conhecemos e ainda tem muito a nos oferecer. Por todas as riquezas vindas da sua cultura, ele pode ser considerado uma verdadeira ‘árvore de negócios’”. “Técnicos do Incaper – Instituto Capixaba de Pesquisa e Extensão Rural aguardam a chegada de janeiro de 2007 para efetivar o cumprimento da meta de fornecimento de 5 milhões de mudas de eucalipto para os produtores rurais do Espírito Santo. O projeto faz parte do Programa de Extensão Florestal criado pela Secretaria de Estado da Agricultura. O objetivo é promover o reflorestamento de imóveis rurais, por meio do fornecimento gratuito de mudas de eucalipto”.

Janeiro de 2007 já foi. Eu ainda não tinha identificado eucaliptos no caminho para Bom Jesus, mas após ser alertada sobre a primeira leva passei a ver pelo resto da viagem (às vezes até onde não tinha). Eles chamam isso de reflorestamento. Está acontecendo. De onde você acha que o agricultor do interior do estado tirou as informações que ele tem sobre o eucalipto? É a “árvore de negócios” dele, “dela tudo se aproveita, tudo se transforma”. A verdade é que a versão do jornal é a mais conhecida. A questão do eucalipto é uma baita polêmica à qual muitos são alheios, incluindo vários proprietários que vêem na sua monocultura uma nova alternativa de renda. Eles não têm culpa.

Sim, acredito que essa expansão louca promovida pela Aracruz Celulose em conluio com o Governo do Estado causa um impacto fulminante no meio ambiente. Não sou especialista nem nada, mas acredito nas pesquisas que dizem o quanto a monocultura de eucalipto compromete a biodiversidade, arrasa a mata nativa, empobrece o solo e consome água em tamanha quantidade que pode afetar significativamente os recursos hídricos. Li numa reportagem do Globo Rural que “as raízes do eucalipto não têm como sugar a água do subsolo como se pensa comumente”, pois estudos realizados mostram que elas não chegam a descer mais de 2 metros em busca de nutrientes, enquanto o lençol freático mantém-se estável a uma profundidade que varia de 16 a 25 metros. Em contrapartida, li a fala da geógrafa e técnica da Fase (Federação de Órgãos para Assistência Social e Educacional) que diz que só no norte do Espírito Santo já secaram mais de 130 córregos depois que o eucalipto foi introduzido no estado.

Uma história, muitas faces; e eu fico mais confusa e longe de uma conclusão final. Os estudos que inocentam o eucalipto foram desenvolvidos pela própria Aracruz, em conjunto com universidades e organizações não-governamentais, e a fala sobre as raízes é do próprio agrônomo da Aracruz responsável pelas pesquisas. Aliado ao fato de estarem publicadas em veículos como Globo Online e A Gazeta, as defesas ao eucalipto me geram mais desconfiança que os ataques.

É imprescindível que continuemos pesquisando o assunto e que conscientizemos aquelas pessoas que ainda têm como verdade absoluta a Aracruz Celulose “fazendo um bonito papel” mundo afora. Acho que conhecendo mais estaremos mais próximos de realizar ações concretas e solucionar o problema. E que problemão.

A Feira do Verde acabou. Havia muitas empresas poluidoras lá exibindo stands hollywoodianos para impressionar as crianças. Em contrapartida (sempre há uma contrapartida!) havia muitos projetos maravilhosos também, de pessoas tão maravilhosas quanto. A Feira do Verde acabou. A luta não.

sábado, 15 de setembro de 2007

Um minuto para poesia capixaba

Caridade

Bateram à porta.
Era ela: a miséria.
Trazia nos braços um filho
e a fome nas faces encovadas.
Torturas de frio
nos membros da carne.
Nos olhos vazios,
os dias sem nada.

Dou-lhe leite
para o filho;
um prato de feijão
para a fome,
casaco de lã,
mangas raglã
que um dia foi chic.

E o Vazio?

Não posso minorar

os males do mundo.
Limitada
por mil razões,
convicções,
frases feitas.

Caridade existe? Não!
- Egoísmo, disfarçado num pedaço de pão.

Marilena Soneghet Bergmann

(Nas asas do vento)